JUNG E O INCONSCIENTE CRIATIVO
DANIELLE BITTENCOURT
RESUMO
O referido artigo trata-se de um
capítulo retirado da conclusão da monografia apresentada pela autora no curso
de Pós Graduação em Psicologia Junguiana pelo IBMR/RJ, onde se faz um paralelo
do Desenvolvimento do Grafismo Infantil, a Arteterapia e os Processos Criativos
do Inconsciente. Neste trabalho, se realiza um paralelo da relação do Consciente
e Inconsciente para C.G. Jung, de que forma acontece esta dinâmica, quais são
os caminhos e as possibilidades de que dispomos para identificar estes
processos, e a importância da Arte como a forma mais saudável de intervenção.
ABSTRACT
The article referred to is from a chapter from the
conclusion of the essay presented by the author for the post graduate course in
Junguian psychology for the IBMR/RJ, in which the parallels between the
Development of Infantile Graphic Art, Art Therapy and the Creative processes of
the Unconscious mind are compared. The work studies the relationship between
the Conscious and Unconscious mind, according to the theories of C.G. Jung, how
they interact, the methods and possibilities with which we can identify these
processes and the importance of Art as the healthiest way of intervention.
RESUMEN
Este
artículo hace referencia a la
conclusión de la monografía presentada por la autora, en el Postgrado en
“Psicología Junguiana” por la
IBMR/RJ, donde se traza un paralelo entre el Desarrollo del Grafismo Infantil,
la Arteterapia y los Procesos Creativos de Inconsciente. En este trabajo se realiza un paralelismo de la relación entre el Consciente
e el Inconsciente según las teorías de C.G. Jung, de que manera se desarrolla
esta dinámica, cuales los caminos y posibilidades que disponemos para
identificar estos procesos, y la importancia del Arte como la vía más sana de
intervención.
Durante todo meu processo de estudos de Jung, de
pesquisas e leituras do autor e autores afins, busquei juntar conteúdos que
mostrassem como Jung vê o funcionamento e a dinâmica entre Consciente e
Inconsciente, como eles se relacionam, de que forma se dá esta manifestação,
este fluir de conteúdos e mostrar o quanto nosso Inconsciente é Criativo.
E de alguma forma eles precisam vir à tona. Uma das
maneiras que nós Arteterapeutas entendemos ser a mais saudável é através da
expressão da Arte.
A
consciência por si, não explica tudo, já que os atos conscientes muitas vezes
são ininteligíveis – “faço e não sei por que fiz”.
Fazer equivaler o psíquico, não dá para reduzir o
psíquico à consciência, não é possível.
Buscaremos primeiro compreender a definição do Eu segundo Jung:
Chamo consciência à referência dos conteúdos
psíquicos ao EU, na medida em que for entendida pelo Eu como tal. As
referências ao Eu, desde que não sejam percebidas pelo Eu como tal, são
inconscientes. A consciência é a função ou atividade que mantém a relação entre
conteúdos psíquicos e o Eu. (JUNG, 1967).
Portanto, o Eu
para Jung é visto como sendo um centro de consciência constituído de um
aglomerado de representações chamado de Complexos do Eu, como se fossem nós de
energia situados na consciência. Ele diz também que o Complexo do Eu é tanto um
conteúdo da consciência como uma condição da consciência e que este Eu
simplesmente não passa de um complexo entre outros tantos complexos. (JUNG, 1967).
Nise da
Silveira, que foi uma grande seguidora dos pensamentos de Jung, define o
conceito de Consciência como sendo, o EGO, o centro da consciência, e lá, se
desenrolam todas as relações entre os conteúdos psíquicos e o Eu, e para
qualquer conteúdo tornar-se consciente ele tem que se relacionar com o ego. Os
que não conseguem, por algum motivo, vãos para o inconsciente. (SILVEIRA,
1997).
Enumerando os conceitos Junguianos
além do Complexo do Ego, que explicitam o consciente, temos o inconsciente
pessoal e o coletivo. Jung define inconsciente como: “Um conceito
exclusivamente psicológico, no qual estão abrangidos todos os conteúdos ou
processos psíquicos que não são conscientes, quer dizer, que não estão
referidos ao EU de um modo perceptível”. (JUNG, 1967).
Quais são os
diversos modos pelos quais se ligam os conteúdos conscientes e inconscientes da
nossa mente?
Sabemos que quando “algo”
escapa de nossa consciência este “algo” não deixou de existir, apenas o
perdemos de vista. Normalmente são
conteúdos emocionais muito fortes, que não conseguem vir para a consciência por
serem conteúdos muito conflituosos. Portanto, parte do inconsciente consiste de
uma profusão de pensamentos, imagens e impressões ocultas e que, apesar de não
parecer, continuam a influenciar nossas mentes conscientes.
Jung fala que a
consciência só consegue iluminar algumas imagens de cada vez, mas elas estão
lá, latentes, ou talvez, adormecidas, guardadas no inconsciente, prontas para a
qualquer momento vir à tona.
Os processos
inconscientes, por si mesmo, não são percebidos, somente o são através das
formações do inconsciente. É como se existisse um barreira acústica, conteúdos
que diferem dos discursos morais, sociais, da cultura que o sujeito está
imerso, são rejeitados, mas não desaparecem, eles vão pro inconsciente, ficam
lá guardados e pode demorar dias, meses, anos para fazer seu retorno. Os que
não, os que conseguimos suportar, vão pra consciência.
Refiro-me
aqui a coisas que ouvimos e vimos conscientemente e que, a seguir, esquecemos.
Mas todos nós vemos, ouvimos, cheiramos e provamos muitas coisas sem notá-las
na ocasião, ou porque nossa atenção se desviou ou porque, para os nossos
sentidos, o estímulo foi demasiadamente fraco para deixar impressão consciente.
O inconsciente, no entanto, tomou nota de tudo, e estas percepções sensoriais
subliminares ocupam importante lugar no nosso cotidiano. Sem o percebermos,
influenciam na maneira pela qual vamos reagir às pessoas e fatos. (JUNG, 1964:34).
Descobrir o
inconsciente nos torna pessoas “ricas”, descobrir que temos um banco de dados
com conteúdos belíssimos, conteúdos estes, de nosso passado que somados com
idéias presentes formarão pensamentos inteiramente novos e criativos.
E Jung diz que
uma maneira rica e produtiva de direcionar este energia, de dar uma expressão
simbólica ao inconsciente, é sublimar através da ARTE, utilizando-se de
matérias plásticos, cênicos, da música, da literatura, da filosofia, de
descobertas científicas etc.(JUNG, 1964)
Se focalizarmos
nossa atenção sobre o inconsciente sem suposições precipitadas ou rejeições
emocionais, há de surgir um fluxo de imagens simbólicas do maior proveito – que
é nosso Inconsciente Criativo.
Inúmeros são os caminhos e as
possibilidades de que nós Arteterapeutas dispomos para fazer com que os
conteúdos do inconsciente venham para a consciência de maneira mais saudável,
rica e eficaz. A Arteterapia trabalha proporcionando um ambiente acolhedor, no setting terapêutico, para que o cliente
sinta-se bem, para que possa fazer contato com suas imagens do inconsciente e
para que estas imagens venham para a consciência, facilitando assim uma maior
compreensão do seu momento de vida.
Através de trabalhos
como, relaxamentos, massagens, imaginação ativa, músicas, cheiros, podemos
propiciar um terreno fértil para captar os símbolos, o sensório, a afetividade.
Num segundo momento, proporcionamos materiais como pintura, desenho, argila; ou
o teatro, a expressão corporal, etc. para fazer a transposição das imagens, configurando
e estruturando , dando forma. E por último entramos com a linguagem verbal para
entendimento e decodificação destas imagens, ao mesmo tempo em que o intelecto
ajuda a estruturar as emoções.
“Os pacientes que tenham talento para a
pintura ou o desenho podem expressar seus afetos por meio de imagens. Importa
menos uma descrição tecnicamente ou esteticamente satisfatória, do que deixar
campo livre à fantasia, e que tudo se faça do melhor modo possível”. (JUNG,
1991, V.8/2: § 168).
Agora entraremos
num campo interessante onde Jung nos faz pensar quando traça uma diferença
entre imagem e fantasia. Ele fala
que quando esta imagem ainda está no inconsciente
ela é chamada de fantasia, e quando,
ela vem para a consciência ela pode
ser chamada de imagem.
Essa
imagem baseia-se, antes, na atividade inconsciente da fantasia, cujo produto se
impõe mais ou menos bruscamente à consciência, como uma espécie de visão ou
alucinação, mas sem o caráter patológico destas, quer dizer, sem que possa
figurar num quadro clínico-patológico. A imagem tem o caráter psicológico de
uma representação da fantasia e
nunca o caráter quase real de alucinação, quer dizer, jamais suplanta a
realidade e difere sempre da realidade sensorial como imagem “interior” que é.
A imagem
constitui uma expressão concentrada da situação psíquica total, não apenas
conteúdos inconscientes ou predominantemente destes. É, sem dúvida, uma expressão de conteúdos inconscientes, mas
não de todos, em geral, e apenas daqueles que, no momento, tenham alguma
utilidade. Essa utilidade de uma constelação momentânea decorre pôr uma parte,
da própria atividade do inconsciente e, pôr outra parte, da situação consciente
do momento, que ao mesmo tempo estimula sempre a atividade dos correspondentes
materiais subliminares, obstruindo aqueles que não convêm. Em semelhante contexto, a imagem será a
expressão da situação momentânea, tanto consciente como inconsciente. (JUNG,
1967, V.6: 513 514).
Jung entende a
fantasia como: “uma fluência da atividade criadora do espírito, uma atividade
ou produto de combinação de elementos psíquicos carregados de energia”. (JUNG,
1967).
A fantasia pode
estar contida, por um lado, num sentido latente, que é sempre algo do devir, e
por outro lado, seu sentido manifesto, um processo de criação.
Para uma
explicação finalista, é a fantasia de um símbolo que, recorrendo aos materiais
de que dispõe pretende caracterizar e apreender um determinado fim ou, melhor
ainda, uma futura diretriz psicológica, uma determinada linha evolutiva no
futuro. Sendo a fantasia ativa a característica principal da atividade
artística, temos de considerar o artista não só como expositor, mas também como
criador e, portanto, como educador, pois suas obras têm o valor de símbolos que
prescrevem futuras linhas de evolução. A maior ou menor universalidade, a maior
ou menor limitação, da validade social dos símbolos, depende da mais ou menos
limitada, mais ou menos universal, aptidão vital da individualidade criadora.
(JUNG, 1967, V.6: 504).
Nas etapas do processo arteterapêutico,
a fantasia aparece no primeiro momento do trabalho , e a imagem, no
segundo. Sendo assim, a fantasia
está no campo do inconsciente e a imagem no campo da consciência.
A
imaginação é, simplesmente, a atividade reprodutora ou criadora do espírito,
sem constituir uma faculdade especial, pois a sua observação é possível em
todas as formas básicas de
acontecimento psíquico: no pensar, sentir, perceber e intuir. A fantasia, como
atividade imaginativa, é a expressão direta, em meu entender, da atividade
psíquica vital, da energia psíquica que só é dada à consciência na forma de
imagens ou conteúdos, do mesmo modo que a energia física só aparece na forma de um estado físico
que, por via física, estimula os órgãos sensoriais. Assim como todo estado
físico, energeticamente considerado, não é senão um sistema de forças, o
conteúdo psíquico, se o considerarmos energeticamente, também não passa de um
sistema de forças que faz sua aparição na consciência. Segundo este prisma,
pode-se afirmar, portanto, que a fantasia caracterizada como fantasma é, na
realidade, a soma de libido que só poderá aparecer na consciência sob a forma
de imagem. O fantasma é ”ideé-force”. O
fantasiar, como atividade imaginativa, equivale ao decorrer do processo
energético da psique. (JUNG, 1967, V.6: 505).
Jung, referindo-se aos conteúdos inconscientes afirma que:
Há
pessoas, porém, que nada vêem ou escutam dentro de si, mas suas mãos são
capazes de dar expressão concreta aos conteúdos inconscientes. Esses pacientes
podem utilizar-se vantajosamente de materiais plásticos. Aqueles, porém, que
são capazes de expressar seu consciente através de movimentos do corpo, como a
dança são bastante raros. Deve-se paliar o inconveniente de não se poder fixar
mentalmente os movimentos, desenhando-os cuidadosamente, em seguida, para que
não se apaguem da memória. (JUNG, 1991, V.8/2:§ 171).
A Arte dá a
oportunidade para que as imagens do inconsciente encontrem suas formas de
expressão. O que interessa para a Arteterapia, como também para Jung é a
penetração no mundo interno do homem, o confronto com as imagens que a energia
psíquica aí configura e a decifração das formas simbólicas. O Homem elabora seu
potencial criador.
Nise da Silveira
em um de seus textos escreve: “Pintar seria agir. Seria um método de ação
adequado para defesa contra a inundação dos conteúdos do inconsciente”.
(SILVEIRA, 1981:13)
Eu penso
que esse espaço interno onde o indivíduo se debate, por mais inconsciente que
possa parecer, é um prodigioso cosmos cheio de potencialidades para o
enriquecimento e aprofundamento de sua existência emocional. (SILVEIRA,
1981:111).
A Arte proporciona este ir e vir, a dança fluídica destes conteúdos
conscientes e inconscientes, possibilita inúmeras representações e elaborações,
nos tornando autores e responsáveis pela nossa história.
Danielle Bittencourt-
AARJ 019 / CRT 43378
Arteterapeuta formada pela Clínica Pomar, Arte-educadora
formada pela Escolinha de Arte do Brasil, Graduada em Educação Artística,
Habilitação em Artes Plásticas pela UDESC (Fpolis-SC), Pós-Graduada em
Psicologia Junguiana pelo IBMR, Especialista em Terapia Familiar Sistêmica
(Núcleo-Pesquisa), Instrutora e Psicoterapeuta Prânica, licenciada pelo
Institute for Inner Studies Inc, Filipinas, Graduanda em Psicologia pela
Universidade Veiga de Almeida- UVA.
Ex-Coordenadora
e Docente do Curso de Pós-Graduação Lato Sensu em Arteterapia pelo AlquimyArt
-SP na região Sul, Coordenadora Acadêmica e Docente do Curso de Pós-Graduação
Lato Sensu em Arteterapia parceria UCB e Integrare - Centro de Arteterapia
Danielle Bittencourt no Rio de Janeiro.
Bibliografia:
JUNG, Carl G. Obras Completas. Vol. VIII/2. A Natureza da Psique. Petrópolis,
Vozes, 1991.
____________Obras Completas. Vol. V. Tipos
Psicológicos. Petrópolis, Vozes, 1997.
____________Memórias, Sonhos e Reflexões. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1961.
_______________ - concepção e organização. O Homem e seus Símbolos. Rio de
Janeiro, Nova Fronteira, 1964.
_______________SILVEIRA,
Nise da. Jung: Vida e Obra. Rio de Janeiro,
Paz e Terra, 1997.
_______________. Imagens
do Inconsciente. Rio de Janeiro, Alhambra, 1981.